O som do V10 ecoa no anfiteatro natural da montanha. De um lado a parede de rocha, do outro o oceano. Ou melhor, uma queda de várias centenas de metros até ao oceano. Entre estes dois limites, serpenteia uma tira de asfalto de boa qualidade. O cenário perfeito para sentir novo Lamborghini Gallardo LP560-4 , combinando nas dozes certas drama, perigo e beleza – uma combinação que assenta perfeitamente a qualquer “Lambo”.
Com a terceira quase a esgotar às 8200 rpm, convergimos velozmente para uma direita fechada. O facto de estarmos a descer só contribui para tornar a aproximação (ainda) mais vertiginosa. O pé direito deixa o acelerador, ao mesmo tempo que o esquerdo esmaga o pedal de travão. A desaceleração poderosa deixa-nos pendurados no cinto de segurança. As ligeiras correcções de direcção necessárias para manter a trajectória não se podem considerar instabilidade, funcionando antes como um aviso de que estamos a exigir do Gallardo tudo o que ele tem para dar, ao mesmo tempo que o chassis se prepara para responder às ordens do trem dianteiro que vão definir o momento e o ângulo de inscrição em curva.
Imediatamente antes deste ponto, dois dedos da mão direita seleccionam a 2ª, criando mais um momento sublime – a caixa robotizada faz um sonoro e eficaz ponta tacão, sobretudo quando seleccionada em “Corsa”, no qual as passagens são mais rápidas e positivas. A frente inscreve-se com facilidade, com o Gallardo aluguer a rodar sobre si próprio (quase com a mesma ligeireza de um pequeno desportivo). A aplicação de potência neutraliza atitude, com a tracção integral a permitir colocar os 560 cv no chão e maximizar a aceleração na curta recta que se segue.
Nestes ritmos, a performance do Gallardo (aluguer) está num nível que exige muito controlo e restrição por parte do condutor, bem como uma grande experiência na leitura (e antecipação) da estrada. É que, curvas e depressões que em “desportivos menores” são feitas de acelerador a fundo, como se não existissem, à velocidade a que o V10 catapulta o Lamborghini passam a exigir fortes travagens. Apesar de o chassis ser um dos mais benignos entre os desportivos desta potência, nem se importando de ser “apresentado às curvas nos travões” (recurso de condução que até potencia a agilidade nos percursos mais enrolados) e/ou absorvendo bossas em pleno apoio sem alterar a trajectória, a verdade é que, em 2ª e 3ª, cada segundo que passamos de acelerador a fundo implica um suplemento de, pelo menos, 25 km/h na velocidade de deslocação.
Felizmente, os travões de aço possuem uma potência e resistência à altura do desafio, mesmo se o ataque inicial e a facilidade de modulação podiam ser melhores. De qualquer forma, para quem quer mais aderência e potência, existe sempre a possibilidade de adquirir os pneus Pirelli PZero Corsa e o sistema de travagem com discos cerâmicos.
Um motor fabuloso
Olhando para o perfil do Gallardo, é evidente que 3/5 do carro estão destinados ao V10 de 5,2 litros e injecção directa. Um pouco à semelhança de um caça, ou de um fórmula, o posto de condução está puxado para a frente, com o habitáculo a cair sobre o eixo dianteiro – a posição de condução com as pernas muito horizontais e as costas inclinadas também radica nas mesmas fontes de inspiração. E basta rodar a chave na ignição para compreendermos que o temperamento do V10 é indissociável de tudo o que tenha a ver com Gallardo. O som, o calor e a presença (quase física) deste fabuloso motor dominam a experiência de estar ao volante do Gallardo
Ao contrário do seis cilindros boxer do 911 Turbo, o V10 “dispara” instantaneamente mal se esmaga o acelerador. Entre as 3000 e as 5000 rpm a onda sonora que emana dos escapes quase deixa adivinhar as explosões em cada um dos dez cilindros. O poder e o músculo são evidentes, mas se ficarmos por aqui estamos a desperdiçar a parte melhor da banda de potência do V10. Pouco depois das 5000 existe uma primeira arrancada, com o nível de empuxo sentido no fundo das costa a aumentar, mas é só após as 7000 rpm que entramos nas gloriosas 1200 rpm finais. Uma vez aqui, o V10 grita a sua fúria de uma forma indescritível (só ouvindo) e a aceleração entra numa outra realidade. De facto, o Gallardo não chega a entrar no limiar da compressão espaço/temporal que é a especialidade do Porsche 911 GT2, mas isso até é uma vantagem, pois existe “tempo” para apreciar a aceleração.
Mas não é só em recta que o V10 faz valer as suas credenciais, pois o enorme travão motor (mérito da elevada taxa de compressão e da reduzida inércia) e a resposta imediata são fundamentais para que se possa equilibrar/pilotar o LP560-4 com o acelerador, fazendo variar a atitude em curva em função das variações de carga aplicadas.
Relativamente ao anterior , a evolução não é tanto nos tempos de aceleração, embora se note que o V10 actual tem mais “disparo” a médios e altos regimes, mas sim nos consumos em condução desportiva, em que se chega a fazer valores entre 5 a 10 l/100 km inferiores. Apesar de tudo, em condições controladas, o LP560-4 faz 21,6 seg. e 257 km/h no quilómetro de arranque (contra 22,1 seg. e 248 km/h do anterior) e atinge o corte em 6ª em menos de três quilómetros, com o velocímetro a marcar 340 km/h – o que confirma os 325 km/h reais declarados pela marca…